Aqui
no trapézio, de pernas para o ar, vejo a vida diferente. As cabeças
lá em baixo seguramente sentadas nas cadeiras maciças. O silêncio
por momentos é um cristal tão leve que consigo ouvir pensamentos.
Imaginam-me ao avesso do que sou.
Aqui
no trapézio, quando salto, a tua mão constante dá-me as asas que
fazem planar e anular o risco da ausência de rede.
Vejo
pequenas esferas perto do chão que parecem suspensas e trémulas.
Arrepiadas. Enquanto isso eu voo para os teus braços de aço e de
certeza tão doce. E sorrio. Para os que me vêem de baixo para cima
sem perceberem que sou eu que estou na posição natural.
Olham
para os nós que fazemos a quatro mãos e que sustentam duas vidas
feitas do lado de cá.
Aqui
no trapézio vivo o sonho diariamente. Acordada. Em plena acção. E
os que vejo, diferentes de mim, apreciando a minha extravagância,
não entendem.
Oiço
ainda o rugido do leão cansado e o choro do palhaço vencido
enquanto me lanço uma vez mais ao teu encontro num espaço suspenso,
concretizado com músculos.
O
espanto esboça uma exclamação admirada. Sorrio uma vez mais.
A vida
aqui no trapézio, de pernas para o ar, é diferente. Estou segura
voando constantemente para o refúgio do corpo do meu amor. Que me
acolhe em cada salto. Sem rede e sem risco. Ao contrário dos normais
lá na terra.
Mal oiço os aplausos ofereço um sorriso final.
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