Chove lá fora, oiço uma música triste na rádio enquanto
espero por ti. Vens tarde mas nada vou dizer. Nem quando tentares articular as
desculpas habituais. Calarei os teus lábios com beijos. Não me olhas de frente.
Para ti, agora que só nela pensas, eu sou uma dançarina do teatro de sombras
chinesas. Uma presença para lá do pano, na escuridão. Um corpo mal iluminado,
oculto num plano secundário.
Chove sempre e não oiço os teus passos entrando em casa.
Deitei-me para que te seja leve a cama. O escuro é teu cúmplice. Tal como as
mãos, os abraços que afagam e confortam recebendo os teus queixumes.
Choras baixinho. Engulo as tuas lágrimas e espero. Por trás
do manto que recebe uma luz suave uma silhueta permanece indefinida, dançando
lentamente. O som é um lamento compassado e complacente da voz de uma esposa
paciente.
Serei a tua âncora, o teu esconderijo, a réstia de força após
a luta sem tréguas.
E quando ela desaparecer eu estarei cá. Por trás da cortina,
feita sombra chinesa.
Espero um tempo sem fim.
Chegarás numa tarde pardacenta. Eu um fumo desvanecido.
Regressarás vencido pelas saudades de quem fui e farás
desaparecer o pano com um gesto forte. A luz do sol entrará em mim e poderás
olhar-me nos olhos.
Chove dolorosamente. Esperarei, nas sombras, até ao fim.
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