Este
livro impressiona. Uma coisa é suspeitarmos de ligações duvidosas
entre o mundo da política e o mundo dos negócios com os advogados
como ponte (sim, estou a usar um eufemismo), outra coisa é ver tudo
explicadinho ao pormenor. É como observar uma necrópsia de um polvo
gigante dissecado ao centímetro. Uma coisa é imaginar um polvo por
fora, outra é vê-lo por dentro.
Ainda
vou no 1º capítulo. Não consigo avançar depressa. Nem o tempo mo
permite nem a a leitura é fácil. Mas apesar da dificuldade, do
incómodo que fica com a percepção de uma realidade que não é
nada benigna, não deixo de ficar feliz por estar a ler este livro.
Finalmente surge uma esperança de que estejam a surgir na sociedade
pessoas, e melhor ainda, jornalistas, que se interessam por
investigar e divulgar este assunto tão crucial para a nossa vida
presente e futura. Porque parece que temos vivido um tempo de
aceitação, de resignação e de desistência em relação ao
“estado das coisas”. Eu vi a chegada deste livro como um ponto de
viragem. Sei que “Os Privilegiados” vieram primeiro mas suspeito
que este livro seja mais importante ainda.
Compreendo
a opção do autor de não ter ligado os pontos, não ter um capítulo
de conclusões. Fez muito bem. Porque as pessoas têm de ter a
liberdade de quererem ver ou não quererem ver. A metáfora dos
pontos que se unem é muito boa. É como aqueles livros de crianças
que são de colorir. Não é preciso ser muito inteligente, basta ter
vontade, para unir os pontos e formar uma imagem. Está tudo lá. A
população tem de chegar a uma conclusão: se quer continuar a viver
assim ou não.
E não
importa muito, a meu ver, se “ o referido sistema de correlação
entre o poder político, as sociedades de advogados e os interesses
empresariais funciona como ordem espontânea (grown order) ou
uma ordem construída (made order) (…).”
O que
interessa é que as coisas como estão só interessam a um grupo
muito restrito de pessoas. E aquilo a que chamamos Democracia na
prática não existe por estar totalmente pervertida em favor desses
particulares interesses.
Muito
perspicaz e lúcida noção do autor de que o Homem necessita de
padrões para conseguir sobreviver ao caos. Sim, é verdade, mas para
isso se inventou a literatura e em particular a poesia. Para
compreender o mundo, seja o natural ou artificial, temos de usar a
razão e o espírito cientifico. Para nosso bem. E aqui entra o
trabalho jornalístico de Gustavo Sampaio, que é objectivo,
minucioso, exaustivo, corajoso e muito bem escrito. Um trabalho com
todo o mérito. Uma pérola monumental.
Um
livro completamente imprescindível.
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