terça-feira, 16 de junho de 2015

A MÃO QUE NOS OPERA (confissões de um cirurgião sobre uma ciência imperfeita)



Diz João Lobo Antunes, no prefácio desta obra: “por mim prescrevia este livro como leitura obrigatória para todos os médicos”.
Eu acrescento que seria bom também para veterinários, por tudo o que têm em comum com os médicos. Com eles partilhamos a falibilidade, o mistério e a incerteza. Três características da nossa profissão que dão título às três partes distintas do livro de Atul Gawande.
Mas penso que o livro tem também interesse para todos os doentes ou doentes em potencial (todos nós), porque não há quem não sinta vontade de espreitar para lá da cortina e ver o que se passa do outro lado.
Tenho verificado que há uma grande parte de pessoas que julga a medicina como uma espécie de magia, onde tudo se resolve de forma automática. O médico olha, vê o que o doente precisa e aplica uma injecção que imediatamente resolve o problema.
Na medicina veterinária acontece a mesma coisa. Um dia um grupo de amigas trouxe-me à consulta um gato encontrado na rua em muito mau estado. O animal mal se mexia, extramente desidratado, malnutrido, febril. Expliquei que teria de o pôr a soro endovenoso e proceder a análises, eventualmente iria precisar de mais meios de diagnóstico, como RX ou Ecografia, uma vez que nada se sabia da história clínica dele e podendo estar afectado de várias doenças possíveis. Como resposta obtive uma pergunta: “em vez disso tudo não lhe pode dar uma injecção para ele melhorar?”
Por outro lado existe o grupo de pessoas que considera, como diz Atul Gawande, “ a medicina como um campo organizado de conhecimento e procedimentos. Mas não é. É uma ciência em mudança constante, de informação incerta, de indivíduos imperfeitos e , ao mesmo tempo de vidas em jogo. A ciência está presente nas coisas que fazemos, sim, mas o mesmo acontece com o hábito, a intuição e às vezes a conjectura pura e simples. O hiato entre aquilo que sabemos e aquilo que pretendemos atingir persiste. E esse hiato complica tudo o que fazemos.

Também me atraiu o facto do autor ser cirurgião e escrever sobre essa área da medicina.
“Nem toda a gente aprecia os atractivos da cirurgia. Quando somos estudantes de Medicina e estamos no bloco operatório pela primeira vez e vemos o cirurgião encostar o bisturi ao corpo de alguém e abri-lo como um fruto, ou estremecemos de horror ou ficamos fascinados. Eu fiquei fascinado. Não foram só o sangue e as s vísceras que me fascinaram. Em primeiro lugar, foi a ideia de que uma simples pessoa tivesse a autoconfiança suficiente para usar aquele bisturi.”

É um livro que nos agarra logo na primeira página e depois do acabar sentimos que queremos ler os outros que Atul tiver escrito. Eu fiquei fã.

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