pormenor de decoração na Pensão do Amor |
O tio Alfredo era só putas e vinho verde. Qualquer tipo de vinho aliás, que a sua esquisitice não se estendia aos licores de Baco. Trabalhar não era com ele. Bonito demais, engatava quem queria. Para mal dos seus pecados também haveria de engatar quem não queria.
Um dia depois de cravar a irmã mais velha em dois contos de réis, saiu para a farra, frenético. Seduziu, incauto, um travesti. Quando descobriu o equívoco partiu para a violência esquecendo-se que não era com uma mulher que lutava. Não foi suficientemente forte para superar os músculos másculos que, de forma aviltante, desprezara. E uma queda abrupta da escada da pensão levou-o a um longo internamento no Egas Moniz. Era assim derrotado pelo preconceito, um vencido da homofobia. Ao traumatismo craniano recente juntou-se a loucura congénita e um belo dia lançou-se de uma janela do edifício para o meio do chão.
O tio Alfredo, de pélvis partida, ofereceu-se a si mesmo mais um ano de hospitalização. Jamais haveria de largar a cama.
Passaria para a casa de repouso onde espalhava o terror pelos velhinhos espancando-os até partir ossos ou fazer sangue.
Morreu aos cinquenta anos da funesta doença cujo diagnóstico permaneceu obscuro.
Ainda hoje, em eventos familiares, quando olho os rostos à mesa, ainda consigo ver, mais diluído, menos diluído, o tio Alfredo entre nós.