quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Salva pelo Camilo e o Eusébio ( o Castelo Branco e o Macário, não, não é o do cinzeiro beijado...)





Quando depois de leres dois livros do Paulo Varela Gomes te sentes atingida por um certo sentimento de orfandade e não consegues abrir mais nenhum livro, mesmo que te tenham sido profundamente recomendados por pessoas da mais alta confiança, só há um remédio: Camilo Castelo Branco. E é fácil, nos dias que correm, pois eles andam a dá-los grátis com o jornal Expresso. Para felicidade minha esta semana foi a vez do "Eusébio Macário, História natural e social de uma família no tempo dos Cabrais" e esse nunca tinha lido. É é tão bom, mas tão bom  que não tem explicação. Ora espreitem comigo só uma pedacinho do início ( acreditem que isto é só a ponta do iceberg pois eu já vou a meio do livro e este excerto é da página 1 e 2)




"Moscas zumbiam com as asas lampejantes em giros idiotas; gatos agachados como velhos sicários pinchavam com muitas perfídias à caça dos pássaros nas densas verduras desbotadas dos arvoredos; canos chiavam nas terras baixas, barrentas, com grandes gretas de calcinações do grande Sol; os lentos bois nostálgicos vergastavam com as caudas ásperas os moscardos que os atacavam de entre os tapumes com grandes sedes impetuosas de frescores de sangue. Havia molezas e estonteamentos abafadiços no ar cheio de sensualidades mordentes. Lavandiscas esvoaçavam nas ourelas húmidas dos regatos, muito garbosas, com pipilações joviais; besouros azuis de tons metálicos luzentes rodopiavam em volteios curtos e muito sonoros; pardais abandados infestavam as painçadas, dando pios hilariantes de bandidos canalhas; cerejas bicais vermelhavam as suas provocações sorridentes como beiços rubros de mulheres vitalizadas de lascívias aquecidas de bom sangue; pêssegos abeberados de sucos doces penejavam; varas de porcos com grunhidos regalados esfoçavam nas esterqueiras, banhando-se com grandes espalhafatos como odalíscas epiléticas de volúpias escandecidas; raparigas esguedelhadas, de narizes arrebitados, com caras fuliginosas de suor e poeira, muito escaneladas, com olhos espantadiços, de secreções amarelas, saias de estopa suja, frangalhona, a trapejar nos canelos esburgados, guardavam bácoros, e davam gritos de um timbre muito agudo que punham eco nas colinas batidas do largo sol; galinhas cacarejavam; galos de cristas escarlates e recortadas, arrastavam a asa com arremetidas parlapatonas de sultões.A Natureza estava cheia de mistérios amorosos e de uma grande espiritualização sensual."

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