domingo, 16 de novembro de 2014
Miss Mardle
A mulher madura que ama o homem fraco.
A mulher madura que durante 12 anos amou o homem fraco.
A mulher madura que viveu 12 anos de amor pelo homem fraco.
Sentiu o útero secar no meio das entranhas e não se importou.
Maior era o amor pelo homem fraco.
O homem fraco, toupeira para a luz que vinha aos olhos,
no final só viu o útero seco.
Casou e teve filhos de uma rapariga nova.
sexta-feira, 14 de novembro de 2014
Bufarinheiro
Bufarinheiro, bufarinheiro
que fadiga, que fadiga
lufa-lufa, lufa-lufa
de bairro em bairro
rua acima, rua abaixo
p'ra mostrar a bufarinha
quero comprar (queres comprar?)
há quem queira, há quem queira
e funciona (está a funcionar)
quanto custa, quanto custa
não sei se poderei pagar
é barato, tão barato
um preço de pasmar
que fadiga, que fadiga
só ferrugem, só ferrugem
nestes ossos, são tremoços
bugigangas, bugigangas
tudo muito bom negócio
(quem não me conhecer
há-de comprar)
vamos todos rezar.
quinta-feira, 13 de novembro de 2014
Escrita
Troca-me o tique de tédio
que torna o branco sujo,
a página pesada e preguiçosa,
o tempo enguiçado e quebradiço.
Prefiro o toque do violoncelo,
as notas entrecortadas por dedos
e então como a cobra descose
a pele furunculosa
assim removo a venda
e me liberto lançando
os olhos à luz
aliviados do vazio
da escuridão.
domingo, 9 de novembro de 2014
UM POEMA DE DUARTE MARQUES
Duarte Marques
(2006)
BRISA
Beijo o ar navegando.
Rasgo o cérebro com brisa.
Iaiai a brisa relaxa-me a cabeça.
Sou uma brisa.
A brisa é magia.
(2006)
BRISA
Beijo o ar navegando.
Rasgo o cérebro com brisa.
Iaiai a brisa relaxa-me a cabeça.
Sou uma brisa.
A brisa é magia.
segunda-feira, 3 de novembro de 2014
abelha
Entrei
pela tua janela semicerrada,
caí no pote da mágoa,
roubei um pouco
(tens tanta, nem dás por isso)
do alimento,
dessa argamassa
para os meus tijolos,
cola das finas películas
que formam a fotografia final.
Um emaranhado de fios
invisíveis
que dão um casulo,
uma identidade.
Para ti de madrugada
fui mosca maldita
sem mel
(se bem me enxotas
melhor volto).
Não há abelhas
sem vício.
domingo, 2 de novembro de 2014
cabelos
![]() |
shedding the past woman and tree with falling leaves, folk art |
Em breve vou deixar de ter cabelo. Cai-me aos molhos. O que nasce, que também é bastante, não o faz a uma velocidade suficiente para repôr as perdas. O que desaparece tinha levado muitos anos a crescer até aos ombros. Como uma árvore que se despe de folhas, o corpo despede-se dos atavios. Quanto tempo me resta de cabelo?
O que sei é que em breve chegarei ao ponto em que olhando para trás tudo fará sentido. Só olhando do fim para trás se faz luz no que vivemos, como dizia o filósofo. Neste momento, ainda, olhando para diante tudo é nevoeiro e interrogações, algum cabelo, pouco, disfarçado no meio dos ganchos, dos chapéus. Por enquanto ainda consigo manter a ilusão de ser a mesma através de estragemas ou feitiçarias, como queiramos chamar. Mas quanto tempo me resta de cabelo?
Não deve ser muito, já. Ao contrário do que muitos pensam o tempo existe mesmo. E acelera a grande velocidade no final.
sábado, 1 de novembro de 2014
NOITE DAS BRUXAS
vi-te
com olhos
alheios
olhos
suspensos
olhos
enucleados
olhos
desistentes
olhos
paralisados
com ávidos
olhos
e não te vi.
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